Carro de homem assassinado vira negócio na mão de secretário

 

Secretário de Meio Ambiente de Piúma negocia carro de morto através da namorada em uma imobiliária, na hora que foi descoberto, tentou chantagear e ameaçar usando seu cargo público

 

A servidora pública Loraine Guimarães Scheidegger comprou um terreno em Piúma. O imóvel, que custou R$55 mil foi adquirido de uma corretora local, e teve como parte do pagamento uma picape Fiat Strada, registrada no em nome de Cirilo de Oliveira Cunha. Loraine que também é servidora pública municipal é companheira do secretário Municipal de Meio Ambiente, Raniery Miranda. Tudo estaria normal se não fosse por um detalhe: Cirilo está morto desde novembro de 2012.

Quando Cirilo faleceu, seu irmão, conhecido por Lacerda transacionou o veículo com um homem de apelido Dudu que comercializou com Raniery em uma revendedora em Piúma.

De acordo com o dono da revendedora, que pede anonimato nessa mesma época Raniery tinha um caminhão pequeno exposto no local e se interessou por trocá-lo pela picape, assim como Loraine fez ao negociar a compra do terreno. Na hora de transferir o carro para o nome de uma das sócias da imobiliária, foi descoberto que o dono estava morto há mais de cinco anos.

Mesmo diante da afirmação de Lacerda de que não havia nada de irregular com o carro, a imobiliária não aceitou como parte do pagamento. A imobiliária concedeu 10 dias para a resolução do problema sob pena de rescindir o contrato, que viria acompanhado de uma multa de 30% do valor do negócio.

O clima esquentou

Loraine então esteve na imobiliária no dia 13 de julho a fim de desfazer o negócio. De acordo com Floriano Chácara, sócio da imobiliária, após a saída da companheira, Raniery retornou sozinho à empresa e, muito nervoso, ameaçou e chantageou, fazendo-se valer de seu poder como secretário. “Ele estava muito nervoso e nos ameaçou dizendo que se o contrato não fosse rasgado imediatamente, ele pediria vistas de todos os processos da imobiliária na Prefeitura, porque, de acordo com ele, ele manda no prefeito”, disse Floriano.

Procurado pela reportagem, Raniery não quis apresentar sua versão dos fatos, mas, após acusar a editora de perseguição, sugeriu que o Espírito Santo Notícias fizesse uma reportagem sobre venda irregular de terrenos em Piúma.

“Suas intenções já estão bem claras, faça o que sua consciência e profissionalismo mandarem. Eu não tenho o que me explicar”, afirmou o secretário, sugerindo, em seguida, que fosse feita uma matéria sobre loteamento irregular. “Sim, faça uma matéria sobre loteamento irregular e sobre benfeitorias com máquinas públicas nesses locais”. Loraine preferiu conversar pessoalmente com a reportagem, mas até o fechamento dessa edição não conseguimos contato. “Jamais falarei de assuntos pessoais por e-mail, telefone ou whatsapp, pois tratam de assuntos inerentes a minha vida pessoal se quiser conversar tem que ser pessoalmente. Sou advogada e gosto das coisas corretas”, disse ela!

No dia do fato, 12, por telefone, Raniery falou com o jornal e disse que foi chamado de bandido pelos donos da imobiliária e que pelas acusações recebidas, tinha motivos suficientes para dar uma coça em Floriano Chácara, e que não o fez por conta da idade.

Rolo

O secretário de Meio Ambiente, Raniery Miranda foi procurado pelo jornal para apresentar a versão dele no caso, mas preferiu ignorar.

Silvana também falou com o jornal, comentou que o dono da revendedora de carros onde Raniey havia negociado o Fiat Strada chegou ao seu escritório com o Lacerda dizendo que teria de fazer a transferência do veículo que Raniery havia negociado com a imobiliária. Quando ela perguntou pelo dono foi informada de que estava morto há cinco anos. Ainda assim, o Lacerda disse que faria a transferência e bastava ela passar os documentos da pessoa para quem o carro seria registrado. Ela disse que não faria assim, pois gosta das coisas certas e que não faz negócios dessa forma.

De acordo com Floriano Chácara, inicialmente, quando foi informado que o carro colocado no negócio estava registrado no nome de uma pessoa que já havia morrido, apresentou uma segunda proposta a Loraine, dando inclusive um prazo de cinco meses para venderem o carro ou conseguirem o dinheiro para substituir o valor de R$30.000. Porém, no dia seguinte a conversa com Loraine, o secretário teria preferido chantageá-lo com o cargo que ocupa na Prefeitura de Piúma, caso não rasgassem o referido contrato assinado pela sua companheira Loraine. “Nesse momento e o chamei de bandido, pois um homem que chantageia o outro recebe que nome? Pra mim é bandido, fez chantagem usando o cargo dele, onde já se viu um secretário dizer que manda na Prefeitura? Só perdi a paciência quando ele queria que eu rasgasse o contrato e ficasse com o prejuízo, aí ele ficou nervoso. Enviamos uma notificação pelos Correios para Loraine, concedendo 10 dias e avisando que iria judicializar o processo. Ele chegou ‘com duas pedras na mão’, eu disse que não iria dar problema, que daria um prazo para tentar substituir o dinheiro do carro”, frisou Floriano Chácara.

Entenda ao caso

O produtor rural Cirilo de Oliveira Cunha, foi assassinado com um tiro na cabeça, enquanto caminhava para sua roça de abacaxi, na localidade de Lagoa do Siri, em Marataízes, no dia 10 de novembro de 2012. O crime teria tido motivo torpe, o acusado na época estava devendo a Cirilo e disse que não pagaria mais e ainda teria roubado três mil em dinheiro.

O irmão de Cirilo, também produtor rural em Marataízes, Lacerda de Oliveira Cunha conversou a reportagem e contou que tinha muitos bens. Quando comprou o Fiat Strada vermelho zero quilômetro em uma concessionária, teria colocado esse veículo no nome do irmão, para não ter acúmulo de bens na hora da declaração do Imposto de Renda. Ele jamais imaginou que Cirilo fosse assassinado e que o carro seria um problema.

Ao ser questionado sobre a venda do carro, estando o mesmo no nome do irmão assassinado em 2012, Lacerda disse que não teria problema. “Não resolvi antes esse problema porque eu não tinha a intenção de vender o carro e, quando eu fiz o negócio, expliquei que tinha o problema da documentação. Eu sou o dono do carro e só passei para o nome do meu irmão. Quando eu passei o carro no nome dele não contava com essa tragédia. Agora vou passar para o nome de Dudu e ele vai arcar com o valor da transferência”.

Fato novo é que Lacerda contou que passou o carro para um homem de apelido Dudu que transacionou esse veículo com o secretário de Meio Ambiente, Raniery Miranda em uma revendedora em Piúma em troca de um caminhão pequeno que pertencia a Raniery, que inclusive pagou a diferença.

 

A palavra da revendedora

A Reportagem foi à revendedora de carros usados e conversou com o seu proprietário que pediu que o nome dele não fosse revelado. Ele contou como o veículo de Cirilo chegou até lá. “Ele apareceu na loja que é aberta para todo mundo; qualquer pessoa pode entrar como pode sair. Dudu trouxe o carro e eu ofereci uma troca em um caminhão que era de Raniery. Ele gostou do caminhão, eu chamei o Raniery para fazer o negócio. Confirmamos o preço, puxei a documentação, não tem restrição nenhuma e tudo estava pago”.

A partir de então o veiculo passou a pertencer a Raniery. Posteriormente, o carro entra em outro negócio e o dono da revendedora afirma que não tem parte nenhuma e nem saber o que fizeram. “Fizeram esse acordo na rua, depois que Raniery veio aqui e falou que o carro era de Silvana e Rosangela Ribeiro, mas os que eles fizeram não sei. A namorada de Raniery veio aqui, buscou o carro, pegou os documentos, levou embora, depois de três dias a Silvana e Rosangela disseram que o carro pertencia a elas e estava no lavador. Elas só possuíam o documento verdinho”.

O dono da revendedora afirma que só descobriu que o carro pertencia a um homem morto no dia da transferência. “Eu tomei um susto, eu nem imaginava, eu estava na loja. Na hora que fizemos o negócio, o Lacerda por telefone disse que transferia o recibo na hora que o carro fosse vendido. Achei que estava tudo tranquilo. Se eu soubesse que esse carro tinha problema, de maneira nenhuma eu pegaria. Não pego veículo desse jeito, nem com restrição”.

Há 15 anos fazendo venda de carros usados em sua revendedora jamais teve qualquer problema semelhante a esse.

O caso dos terrenos

O secretário de Meio Ambiente, Raniery Miranda durante a conversa no WhatsApp com o jornal, insinuou que os terrenos do Portinho, comprados pela imobiliária estão irregulares. Diante dessa acusação, o jornal questionou a Floriano e a Silvana qual a irregularidade existente para Raniery ameaçar pedir vistas ao processo que se encontra na Prefeitura.

Silvana Boechat foi enfática: disse que já deu entrada em dois processos na Prefeitura, sendo um em dezembro e outro em janeiro, e ambos desapareceram misteriosamente na Procuradoria. O passo agora é aguardar a Prefeitura concluir a desapropriação. “Não se trata de loteamento, o terreno foi desmembrado em várias partes e se tornou três áreas dentro de uma matrícula. A Prefeitura já tomou posse administrativamente de uma área para abrir as ruas sem o decreto, dois processos nossos já sumiram. Temos a escritura lavrada em cartório e a baixa da área rural para urbana”, explicou Silvana.

Floriano explicou que quando adquiriram os terrenos a Prefeitura já fazia uso de uma rua que dá acesso a Praia do Pau Grande e a Cesan já havia instalado no local uma adutora. “Esse processo que demos entrada novamente na Prefeitura é para continuação da desapropriação. Estamos pedindo que a Administração dê continuidade tendo em vista que ela já se apropriou da área, tivemos que cercar urgente para evitar mais problemas”, salientou Floriano.

Em relação à acusação implícita feita por Raniery ao tentar justificar as suas ações de que a imobiliária havia feito obra usando máquina pública, Floriano rebateu dizendo que a Prefeitura havia feito uma licitação pública, “não foi usado máquinas para nos beneficiar. Se a Prefeitura não resolver esse impasse da desapropriação, infelizmente teremos de entrar na justiça”, disse Floriano que está em Piúma desde 1995, desde 1982 é perito e há 31 anos engenheiro civil, com pós-graduação em perícia de engenharia e avaliação imobiliária.

 

 

Advogada explica como deve proceder nesses casos

A advogada consultora do Jornal Espírito Santo Notícias, Janine Paraíso explicou como se deve proceder uma pessoa que tenha um veículo, registrado no nome de uma pessoa que já tenha falecido. “No caso de compras em lojas de usados, desde maio de 2015 a lei 13.111/15 determina que elas sejam obrigadas a disponibilizar o histórico do veículo vendido ao comprador.  Uma vez fechado o negócio e com os trâmites financeiros finalizados, o vendedor deve preencher o Certificado de Registro do veículo, assiná-lo e reconhecer firma, o comprador tem o prazo de 30 dias para realizar a transferência de propriedade. Ultrapassar este prazo é uma infração considerada grave, que é punida com multa e inclusão de cinco pontos na carteira nacional de habilitação”.

Janine aproveitou a ocasião e citou um trecho de uma processo já julgado que se assemelha ao caso em questão. “É inescusável o erro ou ignorância alegado por aquele que, por sua própria negligência, dá causa ao desconhecimento de eventuais vícios existentes no bem. dolo – veículo usado – histórico do veículo – vendedora que não era segunda dona, veículo recuperado de roubo, falta de diligência do comprador. Eventual omissão pelo vendedor quanto ao histórico do veículo não configura dolo já que tais informações poderiam ter sido obtidas pelo interessado mediante simples consulta a cadastros via item no site do DETRAN”, explicou a advogada.

 

Foto: Janine Paraíso/ Luciana Maximo

Legenda: A advogada Janine Paraíso explica que antes de fechar o negócio é preciso consultar a situação do veículo.

 

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