De adolescente para adolescente
O texto é de opinião, de Sammara Lopes da Silva, aluna do 2° ano técnico em Logística, da Escola Estadual Professora “Filomena Quitiba”.
Como devo me sentir? Como devo me comportar? Sou apenas uma adolescente comum. Meus cabelos estão caindo, minha pele está ficando pálida. A cor do céu já não é mais a mesma. A lua cheia não brilha mais como deveria brilhar, – aos meus olhos.
A pressão psicológica dos meus pais está me matando, eles dizem que devo me esforçar para seguir seus passos na medicina. Eles nunca me perguntaram sobre o que eu quero fazer quando crescer, mas meu sonho é ser professora, – eu seria a ovelha negra da família.
Não sei o que sinto agora, é tudo muito confuso. Meus pais não me entendem, não tenho amigos na escola e muito menos fora dela. Pensei que a adolescência era uma fase em que se sentia vontade de viver e experimentar várias coisas novas e divertidas. Por que comigo é tão diferente? Por que fui nascer assim?
Se eu tivesse cabelos longos e olhos azuis, eles não fariam bullying comigo? Os meninos se interessariam mais por mim, – aliás, nem sei se gosto de meninos, eles são nojentos.
Por que esperar até meus seios crescerem? Eles me chamam de tábua!
Eu sou mesmo uma menina?
Por que não tenho o corpo que uma menina deve ter?!
Depois que o João disse que eu parecia um menino por conta das calças largas que eu vestia, passei a não gostar mais do meu corpo, – eu não contei isso pro papai, claro. Já faz um ano que eu não escuto eles me perguntarem como estou me sentindo. Tão ocupados com o trabalho que nem reparam mais em mim. Pedi para cortar meus cabelos médios escuros, como a noite de uma segunda-feira nublada e eles simplesmente disseram: “faça o que quiser com seu cabelo, só não fique careca”.
Eu sou um fantasma? Por que ninguém me enxerga?
Dias e dias se passam, mais e mais eu me perco nessa bolha gordurosa de uma sociedade orgulhosa e inconsciente. No setembro amarelo eles abraçam tanto as pessoas e gritam “Não se mate! Há uma solução para os seus problemas”, mas no próximo mês eles simplesmente ligam o dane-se para nós, seres humanos assombrados por uma tristeza sem fim.
O suicídio não precisaria ser uma solução se fossem mais atentos aos sinais de uma pessoa depressiva. Tudo o que nos importa é a percepção da nossa existência.
A solução não está em morrer, mas qual a saída pra essa dor?
Depressão em adolescente não é preguiça e nem simplesmente o uso excessivo do celular, é perigo.
Morremos toda vez que ouvimos dizer que é preguiça ou que não temos futuro por estarmos assim. Precisamos de ajuda, ainda temos tempo para se ajudar antes que o pior aconteça com a próxima vítima dessa doença cruel.
Grifo nosso
A adolescente que assina o texto foi convidada pelo jornal para escrever o que se passa na cabeça de um adolescente, o que leva a tantas dúvidas e qual é o tamanho de suas dores.
Temos perdido com muita frequência adolescentes, alguns, não tem suportado o fardo que depositaram em seus ombros. Cobranças, frustrações de gente grande que desconta em gente ‘miúda’ ainda. A fase é complexa, mas passa. Todos passamos por ela, ora com espinhas no rosto, ora com cabelo crespo, ora com a pele preta, com cabelo de macarrão, ora cheios de clichês e chavões carregados por religiões que ditam disciplina e alienam mentes, ainda não prontas para discursos, outrora cheios de ódio e intolerância, tantas vezes. Ninguém sabe o que é e o quer aos 14, 15, ou 16 anos. Eu ouvi muitas vezes que seria condenada e iria para o inferno se gostasse de mulher. E agora eu pergunto, e os maridos que matam suas mulheres? E os que traem suas esposas? E os pedófilos, os que estupram suas filhas e enteadas, ou netas? O inferno é só para mim? De que inferno estão falando? Terei eu que ser infeliz para obedecer o que mamãe entende de céu e inferno? Quanto silencio, quanta dor, quanta ausência…
Perdemos quem amamos por não escutarmos, julgarmos, abandonarmos a própria sorte. Ah, mas está fazendo terapia e não toma jeito! Mas que jeito? Querem impor seus conceitos em uma geração que aprende tudo pelo celular, na cara de seus pais que lhe deram o presente no último natal, o mesmo aparelho que não sai das mãos deles, sempre ocupados demais para cuidar.
É isso, Samara é adolescente e sonha com o curso de Letras, o jornal a convidou para fazer um estágio e ela gosta de escrever. Já tem até um livro escrito e se for professora, que eu acredito que seja, será excelente e multiplicadora de uma profissão que exige dedicação, entrega e vocação. Seja bem vinda, menina! És linda, com cabelo curto, magra e cheia de interrogações. E no futuro bem próximo, uma grande escritora e professora, a depender deste veículo, colunista e jornalista.
O texto retrata um pouco da realidade do que vive um adolescente. Confusos, medrosos, dóceis, questionadores, curiosos, inseguros e carentes. Prontos a amar e odiar no mesmo instante. Essa fase também passa!