Barganha na Bernardo Horta: o passado vive no presente

Barganha, uma prática do passado que continua no presente, na Rua Bernardo Horta em Cachoeiro, o negócio é de manhã, até as 10h30.

A efervescência no coração da cidade é a mesma. As personagens são outras, algumas ainda bastante conhecidas. É pra lá e pra cá. A pressa no meio da paciência, uma antítese paira no sol escaldante da Capital Secreta do Mundo.

É, lá pelas bandas de Cachoeiro de Itapemirim, na terra de Rubem e Newton Braga, de Maria Gasolina e Regina Grafanassi, Sérgio Sampaio, Agulha e Roberto Carlos. Na terra do cineasta Carlos Imperial, do saudoso professor Deusdedit Baptista do nosso amado Liceu.

Ah, que saudades das ruas, do meu Ateneu, da Quintiliano Azevedo, do Paulinho Vela Acesa que tantas pautas me renderam no meio dos becos e vielas, o golpe cinderela.

Estive por lá nesta semana, por duas vezes. Entre um café na Padaria Guandu, uma live, uma prosa, uma breve passada no Mercado Quincas Leão, uma pausa nas vielas por detrás da Bernardo Horta e uma compra no Mercadão, uma cena me fez perder a pressa: a barganha de relógios e celulares entre um poste e outro, aos pés da escada do Clube dos Diretores Lojistas, em frente ao Mercado da Pedra. Que ironia do destino, aos pés do CDL.

O local me faz recordar como tudo começou, nas relações comerciais, no passado e no presente. Um clube para administrar interesses lojistas e, aos pés, barganhistas. Eles estão lá todos os dias, entre 8h00 e 10h30, cotidianamente, impreterivelmente. Um grupo de homens aposentados. Alguns com os braços repletos de relógios, anéis, cordões e celulares, os mais antigos.

Filho do seu Aguilar Granziere, de origem italiana, Luiz tem 65 anos, é viúvo e pai de três filhos. Hoje, mora no Gilson Caroni. Nunca quis trabalhar de carteira assinada para ‘seu’ ninguém. Aprendeu com o seu pai a “cortar”, é assim que definem a barganha, que muitos falam “breganha”. Foi tropeiro e trotou com seu cavalo e seus animais por todo o estado, do Caparaó às montanhas. Desde os 11 anos nesta lida livre.

Sem pressa, no seu estilo, óculos escuros e boa lábia, seu Luiz revelou que ‘manta’, tomou uma que não esquece jamais, mais de 60 cabeças de gado. Montada, só se for no cavalo. Faz questão de afirmar que paga todo mundo certinho.

Ganhando a vida em diversos municípios onde chegava a cavalo, seu Luiz gostava mesmo de barganhar propriedades, terras, animais e carros. Conquistou cinco propriedades de terra, tem apartamento e já foi dono de cinco açougues e lanchonetes. Foi ele quem inaugurou a exposição em Vargem Alta com seus animais e em Marapé, hoje Atílio Vivácqua.

O negócio hoje é mais para celular, relógio, cordão de prata e outros. Mas é só para passar o tempo, encontrar os amigos e prosear.

José Carlos Gomes, 60 anos, reside no Coronel Borges, é aposentado e vive de barganha há 10 anos. Disse que no passado o auge eram as trocas de vídeo cassete, DVD, caixa de som, aliança, cordão, pulseira e brinco de prata, carro e moto.

A lógica é ganhar, ou levar uma vantagem. “Não tem como não tomar uma manta, mas a gente corre atrás do prejuízo”.

Cartão de Crédito e Pix

Hoje, a barganha na Bernardo Horta está mais atualizada, tem até máquina de cartão de crédito e pix. Os barganhistas têm opções no negócio. Por lá, é facilmente encontrado celulares que custam entre R$10.00 e R$40.00, mas nem câmera fotográfica os aparelhos têm. Alguns são até mais evoluídos e custam um pouco mais. São poucos.

Desde os 12 anos, seu João Gonçalves de Oliveira, de 81 anos, barganha. Residente no Vilage da Luz, ele conta que barganhou até a casa onde morava. “A vida inteira fiz negócio, já tomei um bocado de dobrada, agora mesmo tenho uns R$600.00 perdidos. Eu nunca fiquei devendo nada a ninguém”.

Seu João conta com orgulho que trabalhou muitos anos na Andrade Gutierrez e andou demais pelo Brasil. Começou trabalhando como carpinteiro e aposentou-se como mestre de obras. Resultado dos negócios feitos em barganhas, já possuiu mais de 60 relógios de uma vez, se lembra com orgulho.

Hoje, seu João lembra com saudades os amigos da Bernardo Horta que já morreram. Há cerca de 20 anos que o ponto de negociação é lá, em frente ao Mercado.

Seu Célio Lopes, que mora no Nossa Senhora da Glória, disse que agora está mais devagar, mas vira e mexe faz um negócio. Ele gosta mesmo é de manter a prosa em dia, todo dia. Já teve 40 relógios e confessa que nunca tomou uma “montada”.

Deixaram saudades os barganhistas mais antigos como seu Larico, seu Zé, Cafuné, e Dulcino, que ainda é vivo, mas não vai mais pra lá barganhar.

Barganha

A barganha é um termo utilizado para descrever uma negociação ou acordo em que duas partes buscam obter benefícios mútuos. É um processo comum em diversas áreas, como nos negócios, na política e até mesmo nas relações pessoais. Através da barganha, as partes envolvidas podem alcançar um consenso e chegar a um acordo que seja satisfatório para ambas.

Escambo

Escambo é uma atividade de troca, muito utilizada quando ainda não há sistema monetário. Essa troca, conhecida também como permuta ou troca direta, envolve apenas coisas ou serviços, sem o uso de dinheiro. No Brasil, a prática já existia entre as comunidades indígenas. Mas, com a chegada dos portugueses, o escambo ganhou proporções maiores, especialmente pela extração de Pau-Brasil.

O trabalho decorrente do corte e do transporte da madeira feito pelos indígenas era “pago” com utensílios de pouco valor para os colonizadores. Espelhos, facões, perfumes ou aguardente eram objetos que os indígenas recebiam dos europeus pelo trabalho realizado. Apesar do valor reduzido, esses itens interessavam aos indígenas, pois eram inexistentes na América até então.

Troca

A primeira forma de comércio é a troca. No passado, era realizada de forma local. Apenas as pessoas de uma determinada localidade realizavam as trocas. Cada família possuía uma determinada habilidade: pesca, agricultura, pecuária, artesanato, marcenaria, etc. Para garantir o sustento e uma boa produtividade, essa ascendência ocupava-se apenas com essa única tarefa. No fim das contas, produziam mais do que consumiam e começaram assim a estocar. Mas os produtos estragavam e, além disso, a família necessitava de outros itens fora os que eram feitos por eles. A partir dessa situação, deu-se a necessidade da troca. Esse sistema permitia que as pessoas não sofressem com o desperdício de suas mercadorias e ainda obtivessem outros que necessitavam para a sua sobrevivência.

Comércio

Etimologicamente, o termo “comércio” vem do latim commercium, que quer dizer “tráfico de mercadorias”, que vem a ser a troca voluntária de produtos e serviços por outros produtos ou por valores, estando implícito o ato de negociar, vender, revender, comprar algo. De forma geral, todas as relações de negócios.

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