“Desaquenda Demônio”, o senhor é uó!

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Art. 5º Constituição Federativa de 1988.

O bigode do texto traz a citação do artigo 5º da Constituição Federativa do Brasil. E logo logo vais compreender o porquê a jornalista lançou mão da Carta magna abrindo o seu artigo de opinião.

Imagine, senhoras e senhores que lá nos cafundó de Bertioga, uma cidadezinha do litoral de São Paulo, um homem que se diz vereador, eleito pelo povo, o excelentíssimo senhor Eduardo Pereira, 2º secretário da Mesa Diretora, do Partido Social Democrático – PSD se recusou a ler a apresentação do projeto de lei “Respeito tem nome”, voltado ao público LGBTQIA+. E abandonou a Mesa, dizendo: “Ah não, Renata, vou sair fora. Tá louco? Não faz isso comigo. Dar um projeto LGBT para mim? Não, toma, pega aí”, tá gravado.

Sabe por que, senhores e senhoras, a recusa do nobre edil? Por ele ser evangélico! Pasmem.

Talvez a Câmara de Bertioga tenha um Regimento Interno que não classifique este comportamento ridículo do vereador como quebra decoro parlamentar. Mas, que a sua atitude já lhe rendeu em uma semana pelo menos cinco representações no Ministério Público, a sim. Vai se entender com a Promotoria de São Paulo.   

O Projeto de Lei 035/2023 que o vereador se recusou a ler visa criar o programa ‘Respeito tem Nome’, que tem como objetivo, assegurar um atendimento digno a pessoas trans e travestis na obtenção dos documentos necessários para a alteração de nome e gênero em registros. É de autoria da vereadora Renata da Silva Barreiro.

Não tenha dúvida, o nobre edil “arrumou sarna pra se coçar”, desculpe o ditado popular.

A história registra que nos idos de 1.500, Brasil Colônia, há registros no Direito brasileiro e que se confundem com a história do próprio Brasil colonial e com o Direito português de punições aos comportamentos dissonantes do padrão héteronormativo. Isto porque, com a chegada dos portugueses às terras coloniais, em 1.500, marca a data em que passou a vigorar o Direito lusitano, fortemente acompanhado de regulações eclesiásticas católicas.

“Comportamentos dissociados da moral vigente, que qualificava como pecado e como ilícito jurídico tudo que destoasse do coito vaginal entre pessoas de sexos opostos, eram submetidos a forte repressão, sendo considerados, ainda, causadores de desgraças naturais, tais como terremotos, enchentes e dilúvios”. (Rios (2018, p. 134):

E não é que a atitude do vereador, 2º secretário da Mesa Diretora da Câmara de Bertioga, indubitavelmente, remete ao Brasil Colônia. Talvez, o que irmão vereador não esperasse, era que o projeto fosse aprovado em 1ª discussão.

“Não estou falando de homem, de mulher, de via**, do que quer que seja. Estou falando de respeito, falo de cidadania, de ser humano e de humanização. A minha religião é Deus e ela me permite que eu aceite qualquer tipo de pessoa”, disse a vereadora Renata.

Vereador, a sexualidade integra a própria condição humana. “É um direito humano fundamental que acompanha o ser humano desde o seu nascimento, pois decorre de sua própria natureza. Como direito do indivíduo, é um direito natural, inalienável e imprescritível. Ninguém pode realizar-se como ser humano, se não tiver assegurado o respeito ao exercício da sexualidade, conceito que compreende a liberdade sexual, albergando a liberdade da livre orientação sexual”, (professora Maria Berenice Dias, citada na tese de conclusão de Curso do especialista em Direito Público Ramon Bourguignon Gava.

Nenhum legislador deste país, legisla apenas para uma religião, para um grupo de pessoas. “O direito de tratamento igualitário independente da tendência sexual, senhores. A sexualidade é um elemento integrante da própria natureza humana e abrange a dignidade humana. Todo ser humano tem o direito de exigir respeito ao livre exercício da sexualidade. Sem liberdade sexual o indivíduo não se realiza, tal como ocorre quando lhe falta qualquer outra das chamadas liberdades ou direitos fundamentais”.

Quero deixar bem claro ao evangélico – vereador, lá da cidade de Bertioga, a orientação sexual e a identidade de gênero estão vinculados ao indivíduo, como um órgão vital que não pode ser transplantado ou substituído.

Quer queiram, queiram não, senhores legisladores, evangélicos, os avanços jurídicos relacionados à população LGBTI+ precisam ser acompanhados. Isto é assunto para o próximo artigo.

E que fique bem transparente para suas mentes fechadas, preconceituosas, homofóbicas, medíocres e estúpidas. Senhores, nenhum dos AVANÇOS foram fruto de política pública ou proposta do Poder Legislativo. Isto é, a Corte Suprema, guardiã da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), por meio de sua jurisprudência empregou sua competência atípica e diante da inércia do legislativo, legislou, garantindo os direitos previstos na Carta Magna, diminuindo as desigualdades históricas vivenciadas pela pessoa LGBTI+.

TANTO AVANÇO, TANTO A AVANÇAR: O DEVER DO ESTADO DE PROPORCIONAR AO CIDADÃO LGBTI+ O EFETIVO ACESSO AOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS retira de seus cofres, pagos pelos cidadãos LGBTQIA+ TAMBÉM impostos para pagar subsídios a legisladores que deixam de cumprir com suas obrigações enquanto parlamentares. Muitos usam das tribunas para legislar não para o coletivo, ignorando grupos.

Abrimos este texto citando a Constituição federal no artigo, volte ao bigode do artigo e releia.

Direito à vida

O direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos. E a Constituição garante ainda que cabe ao Estado assegurar o direito à vida, em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à subsistência.

Já chega, os números são suficientes para dar um basta a tanto preconceito, tantos assassinatos, tanta homofobia, tanto comportamento abominável, como deste senhor, que se diz vereador. Um país que ainda precisa de leis para exigir respeito para com o outro da mesma espécie e criado à semelhança de Deus.

Como sugere o ministro Alexandre de Moraes, o princípio da igualdade consagrado pela constituição opera em dois planos distintos. “De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente, de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que se encontram em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento de diferenciações em razão de sexo, religião, convicções filosóficas ou políticas, raça, classe social.

A desigualdade na lei se produz quando a norma distingue de forma não razoável ou arbitrária um tratamento específico a pessoas diversas.

Para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discriminatórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável, de acordo com critérios e juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à finalidade e efeitos da medida considerada, devendo estar presente por isso uma razoável relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade perseguida, sempre em conformidade com os direitos e garantias constitucionalmente protegidos”.

E qual é a justificativa do vereador? É evangélico! “Desaquenda demônio”! O senhor é uó!!!

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