Desinformação política, mídias digitais e democracia
Por PHilipe Verdan, Especialista em Políticas Pùblicas
A crescente ubiquidade da internet e das redes sociais às quais ela se liga teriam potencializado o fenômeno,
que agora chega mesmo a ameaçar a lisura dos processos eleitorais em diferentes partes do globo,
a ponto dos responsáveis por essas redes serem chamados a prestar esclarecimentos diante das autoridades
e se comprometerem a viabilizar mecanismos de luta contra as notícias falsas.
As fake news suscitam indagações de variadas ordens, inclusive filosóficas, caso este que ora nos ocupará.
Dentre estas, pode-se citar elementos de filosofia política, como o papel das redes sociais na constituição
de uma nova ordem social; epistemológicas, visto que há uma ligação entre conhecimento verdadeiro e conhecimento falso; e até mesmo ontológicas, dada as variações que os termos falso e seu contrário, verdadeiro, implicam no que tange à apreensão do ser.
O músico carioca Gabriel O Pensador lançou em 2018 durante o período eleitoral em nosso país,
a música “Um só” sobre a banalização da violência e os prejuízos provocados pela disseminação de fake news.
“Banalizam a violência e a coerência some, já não sabem se são homens ou são ratos
Dominados por aquilo que consomem, acreditam mais nas fake news do que nos próprios fatos”, diz um dos versos da canção.
“Se o João tem uma visão e o José não aceita, o José arranca os olhos do João.
Pedro vê José sorrindo e quer vingança por João, então fura os olhos de José com pregos. E assim, olho por olho e dente por dente, ninguém mais pode sorrir e todos ficam cegos”, continua.
Chega até mesmo a ser um truísmo apontar que a verdade é um problema filosófico e, mais do que isso, uma questão que persegue qualquer pensador, cientista ou mesmo técnico. Descobrir a verdade — não são estes traços e travos que poderiam caracterizar todo o empreendimento humano?
A ciência, a religião, os canais de informação, os livros, seu amigo, todos dizem asseverar a verdade.
Existe uma frase batida no jornalismo, que é resgatada quase como um mantra em períodos de crise para reafirmar:
“a imprensa e jornalismo nunca foram tão importantes quanto agora”. Essa frase faz sentido, mas para chegar a essa conclusão é preciso voltar algumas casas a fim de que não seja reproduzida sem reflexão. Passamos por um período de descrédito das instituições, incluindo a imprensa.
A crítica é muito importante, mas com reflexão aprofundada e voltada a repensar estruturas como se organizam os grandes veículos de comunicação no país ao longo da história. É importante questionar os oligopólios formados pelas empresas de comunicação, principalmente, sobre concessões públicas, como são as cadeias de rádio e TV. Também é preciso questionar a falsa “imparcialidade” que assombra a grande imprensa, fazendo com que as escolhas políticas sejam disfarçadas como se não existissem. a Rede Globo tem condensou essas críticas nas eleições de 2022 –
que vêm de todos os lados, tanto da extrema direita, quanto da esquerda. No entanto, a Globo é uma representação, se não fosse ela seria outra em seu lugar. A história da Globo é diretamente interligada ao Golpe Militar, de 1964, assim como o Golpe de 2016.
No entanto, tem assumido papel importante de informação e prestação de serviços durante a pandemia, por exemplo.É uma história composta de contradições.
Então, o problema não é que a Globo exista, mas sim o acúmulo de espaço e poder, que poderia ter sido mudado com a regulamentação
da mídia não realizada nos últimos anos.
A comunicação e o jornalismo não são sobre uma coisa só, não são verdade absoluta, os fatos não existem soltos no mundo para serem capturados, dizem respeito a versões da realidade, portanto, têm que estar no plural.
É interessante para a comunicação que tenham diversos veículos, concorrência e pluralidade para ser representativa e nos formar como indivíduos e como sociedade. Por fim, os momentos de crise são importantes para a gente compreender várias questões.
A crise das instituições pode ser importante para repensar e reafirmar o papel do jornalismo.
“O problema com a mentira e o engodo é que só são eficientes
se o mentiroso e o impostor têm uma clara ideia da verdadeque estão tentando esconder.”
Hannah Arendt