LUTO: João Pedro é mais uma vítima de quem deveria protegê-lo
O artigo de opinião é do estudante de Direito Saulo Zetum
Em qualquer país minimamente decente, o caso João Pedro seria tratado como imperdoável. Teríamos um julgamento de enorme relevância social, política e institucional. Com acompanhamento 24h por dia da mídia e indignação de toda a população. Onde no banco de réu estaria o CPF dos assassinos, mas também o todo poderoso Estado. Seria feito uma autocrítica por vias judiciais. A dor da família se refletiria no povo, as instituições democráticas cobrariam. Seria como em uma fileira de dominó, caindo abuso sobre abuso. E no fim do processo teríamos uma polícia melhor preparada para lidar com seres humanos. Teríamos mais! Muito mais! Teríamos um Estado mudando suas políticas eugenistas de séculos. Um Estado que não praticaria mais o genocídio do povo negro. Nem que promoveria a continuidade eterna da miséria humana.
Infelizmente esse sonho ficará a cargo do nada existencial. Uma utopia caindo degradada sobre o reinado niilistico do ser. Nesse país onde a boçalidade é soberana em todos os poderes, onde é perene a pobreza intelectual se refletindo na pele, no sangue e na cor. Só nos resta esperar qual será o próximo João Pedro a ser assassinado em sua própria casa pelo Estado. O próximo negro a ter um guarda-chuva confundido com uma arma. O próximo artista ou trabalhador negro a ter a família dentro de seu carro a ser alvejada por 80 tiros pelo Exército Brasileiro. Os próximos três estudantes negros voltando de uma festa a levar 111 tiros da PM. 111! A próxima parlamentar negra a ser assassinada pela milícia. A próxima criança negra a levar um tiro indo para a escola.
Hoje 19 de maio de 2020, às 23:22h essa pessoa respira. Pode estar dormindo, talvez esteja fazendo sexo. Quem sabe não esteja rezando ou estudando para um concurso? Você sabe né, meritocracia só funciona nos ideais dos Faria Limers. Ela pode fazer balé ou capoeira. Pode gostar de Coca-Cola ou suco de laranja. Pode ser disciplinada ou preguiçosa. Pode gostar de uma cervejinha ou nem ter idade pra isso. Pode ATÉ tentar o suicídio de sua cultura em prol de uma pseudo-aceitação social por meio de um embranquecimento da alma. Nada disso importa. O certo é que ela nem sabe, mas já está marcada para morrer pelo próprio Estado que jurou protegê-la.