Munir Abud: ‘Em seis meses, avançamos muito e é só o começo’
Entrevista com o diretor-presidente do Bandes
Com seis meses no comando do Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes), o advogado Munir Abud de Oliveira está de olho no futuro: modernizar o banco, ampliar a oferta de crédito e cunhar soluções criativas para levar a instituição aos próximos anos de forma consistente. Com 35 anos, Abud é o mais jovem executivo à frente de uma instituição financeira de desenvolvimento do País e tem, sob seu comando, uma carteira de mais de aproximadamente R$ 800 milhões, com liberações anuais de crédito da ordem de R$ 200 milhões.
Antes de chegar à instituição, o advogado atuou como diretor-presidente da Agência de Regulação de Serviços Públicos do Estado do Espírito Santo (ARSP), foi procurador-geral de Anchieta, no sul do Espírito Santo, e conselheiro da seccional capixaba da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/ES). Confira, nesta entrevista, algumas das principais ideias e projetos do executivo à frente do banco do desenvolvimento capixaba.
O Bandes é um dos principais atores da política de desenvolvimento estadual, seja por meio do financiamento, seja pela articulação de iniciativas para o Estado. Quais seriam as principais diretrizes, em linhas gerais, para a sua gestão?
Os principais pontos em que devemos focar no atendimento às demandas do setor produtivo capixaba são a ampliação de produtos e de serviços e o ganho em agilidade na concessão do crédito. Além do financiamento em que o Bandes já é referência e dos recursos destinados ao desenvolvimento de empresas inovadoras por meio de fundos, o Bandes dará atenção especial aos projetos que proporcionam infraestrutura, quer seja pelos financiamentos aos municípios, quer seja pelo mapeamento e desenvolvimento de parcerias público-privadas. Desse modo, será possível investir em obras e serviços públicos de interesse da população e ampliar a qualidade do atendimento no Estado.
Quais são os principais desafios com a crise gerada pelo novo Coronavírus (Covid-19)? Qual o tamanho do impacto negativo que a pandemia pode causar na economia do Espírito Santo?
Vivenciamos um momento econômico delicado, advindo da pandemia, com impactos significativos no Estado. Não dá para elencar as principais dores dos empresários neste momento, porque são muitas e totalmente diferentes em cada setor econômico. De forma ampla, o que se tem são empresas que observaram a sua curva de crescimento despencar vertiginosamente. Em alguns negócios, a receita caiu a zero ou a quase isso. É um baque extraordinário no fluxo de caixa, especialmente de pequenas e médias empresas. Soma-se a isso, o encolhimento do mercado de crédito. Daí a importância dos bancos públicos, pois são eles que injetam os recursos neste momento de escassez. E o Espírito Santo é um dos poucos estados da Federação que desfruta dessa possibilidade de ter um banco de desenvolvimento. Outra preocupação, também recorrente a todas as empresas que não são consideradas essenciais ou inovadoras, é como manter seus empregados motivados e produtivos e, principalmente, saudáveis.
O importante é destacar que, desde o princípio, o Bandes esteve presente com ações para amenizar os efeitos econômicos devastadores da pandemia. Só para citar alguns bons exemplos, lançamos o Fundo de Proteção ao Emprego, repactuamos contratos e criamos mecanismos para garantir o futuro, como o lançamento do Fundo de Investimentos associado ao Fundo Soberano. Como boa notícia, vemos que as medidas adotadas pelo Governo do Estado já surtiram efeito, ainda em maio, quando alguns indicadores já apresentaram melhora, como o índice de confiança do empresário e a utilização da capacidade instalada da indústria capixaba.
Como avançar nestes mecanismos de apoio ao desenvolvimento econômico e social dos capixabas? Quais produtos e serviços terão atenção especial neste primeiro momento?
O governador Renato Casagrande anunciou R$ 250 milhões no Fundo de Proteção ao Emprego. Para termos noção da importância da cifra, o Bandes tem hoje projetado no seu orçamento cerca de R$ 280 milhões para financiar projetos no Estado. Ou seja, estamos falando em praticamente dobrar a capacidade de investimentos da nossa instituição de desenvolvimento. É quase a criação de um novo banco, apenas com essa linha emergencial que foi criada para atender o empresariado que está sofrendo os impactos da crise ocasionada pela pandemia da Covid-19. Para facilitar o acesso aos recursos, a linha excluiu alguma burocracia, como, por exemplo, a exigência de certidões negativas de débitos junto à Fazenda Estadual. As linhas emergenciais até então criadas exigiam que o empresário demonstrasse o efetivo prejuízo para ter acesso, o que também está dispensado dessa linha atual para os setores hoteleiro, de pousadas, de bares e de restaurantes, além de empresas ligadas ao setor cultural, artístico, turismo, em suma, atividades que têm uma presunção de que foram afetadas pelas medidas restritivas de distanciamento social. Estamos trabalhando apenas com a taxa de juros Selic, então podemos dizer que não há juros reais aplicados sobre esse financiamento. Podemos ter ainda uma carência de até 12 meses para início de pagamento e vamos trabalhar para um prazo total de 72 meses. Ou seja, estamos falando de condições bem atrativas na concessão do crédito e ainda de forma simplificada.
Como vê o processo de desburocratização do banco e como ele pode contribuir neste momento? Como ele pode atuar quando a retomada econômica se iniciar?
A nossa ideia é que esse dinheiro seja de fácil acesso e desburocratizado. O crédito será concedido sem consulta aos órgãos de proteção, sem busca de certidões estaduais e sem certidões federais, à exceção da Previdenciária. Isso quer dizer que concederemos créditos a toda empresa que demonstrar uma capacidade mínima de pagamento. Nós não estamos falando de entrega de dinheiro: é um financiamento e como tal segue alguns normativos do Banco Central, que dizem que ele deve ser concedido àquele que tem condição de devolver. Então, muito embora os juros sejam palatáveis e inexistentes até, já que a correção é feita somente pela Selic, há de se demonstrar a capacidade de devolução desse dinheiro, mesmo que a empresa tenha títulos protestados, em recuperação judicial, e todas as dificuldades que estamos acostumados a verificar no mercado. Tudo isso, para conferir celeridade na circulação desses recursos, tão necessários neste momento.
Qual o papel de um banco de desenvolvimento num momento de crise como este que atravessamos?
O banco de desenvolvimento do Estado tem um papel fundamental em momentos como este que estamos vivendo. E temos que nos colocar na rota de apoio para todo o setor produtivo capixaba, socorrendo as empresas com alternativas de crédito facilitado, desburocratizado e que chegue a todo o Espírito Santo de maneira equilibrada e acessível. Por isso, estamos lançando mão de todo o leque de financiamentos que o Bandes já tem em sua carteira e criando ainda mais instrumentos, como a criação do Fundo de Proteção ao Emprego.
Como o banco de desenvolvimento planeja orientar suas ações para o novo ciclo e, assim, contribuir para os novos rumos do desenvolvimento do Espírito Santo?
Acreditamos que a retomada das atividades econômicas poderá ganhar fôlego na medida em que a vacinação avança. Aliado a esse aspecto, necessário, de cuidado com a saúde pública, é imprescindível que as políticas de fomento à economia proporcionem aos segmentos econômicos condições adequadas para investimentos. Um dos principais instrumentos de execução da política de investimentos e de desenvolvimento socioeconômico capixaba é o Bandes. Para cumprir esse papel, o banco tem recursos para o financiamento a médio e a longo prazos, tanto por programas de apoio quanto por projetos capazes de potencializar atividades econômicas e desenvolvimento regional. Com fontes de recursos próprios ou como agente credenciado repassador de recursos, o banco dispõe de produtos e serviços que atendem às demandas do mercado. Além disso, o Bandes, com o objetivo de alcançar maior eficiência dos serviços prestados à sociedade capixaba, se estruturou para captar recursos externos.
Ninguém estava preparado para uma situação tão grave como o cenário que se desenhou com essa pandemia, o que obriga a reinvenção dos negócios para a sobrevivência. Nesse contexto, podemos falar do surgimento de um novo Bandes, um banco de desenvolvimento reinventado?
O desempenho positivo do Bandes no primeiro semestre do ano é um dos indicativos de que estamos na direção correta. A instituição reposicionou a sua atuação no mercado local, mudou a estrutura administrativa, reduziu a burocracia e promoveu a atualização de produtos e serviços oferecidos aos empresários capixabas. Mais presente e acessível, mais inserido e alinhado às necessidades da economia capixaba, e comprometido em se modernizar, o Bandes vem trabalhando para fazer crédito de qualidade, ampliando o acesso às linhas para negócios prioritários e que impactam na promoção de emprego e renda, de uma maneira articulada. Evidente que a estratégia foi alterada emergencialmente com a pandemia. Ainda estamos em operação de resgate visando a mitigar os efeitos da crise em seus aspectos econômicos, atacando principalmente a ausência de capital disponível ao empreendedor no mercado de crédito.
Existem outros mecanismos de apoio ao desenvolvimento econômico e social dos capixabas?
O Estado quer se posicionar como referência em Inovação e Desenvolvimento e gerar mais oportunidades para os capixabas. Uma das iniciativas de mais vanguarda neste País é a criação do Fundo Soberano, pois ele terá uma ramificação focada em Inovação e Desenvolvimento, por meio do Fundo exclusivo de Investimento em Participações (FIP). Esse fundo será o maior, nacionalmente, da categoria venture capital, com aporte inicial de R$ 250 milhões. O Espírito Santo é, portanto, o primeiro da Federação a ter um Fundo Soberano, criado a partir de recursos próprios provenientes dos royalties do petróleo. Esses recursos serão investidos a critério exclusivo da empresa gestora que está em fase de seleção, preferencialmente, em empresas que tenham a sua atividade principal voltada para a inovação ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo ou social.
A vocação do Estado para o mercado exterior pode ser uma oportunidade, dada a volatilidade cambial?
Mais de 30% do PIB do Estado é responsabilidade do comércio exterior. Isso demonstra a intensidade e a qualidade produtiva do nosso Estado. Estamos, sem dúvida, em posição de destaque entre todos os Estados da Federação. Entretanto, estamos muito concentrados no minério de ferro e em produtos ligados ao aço, e a demanda por esses produtos caiu neste momento de pandemia. Mas na medida em que os países retomam o controle da situação, naturalmente, a demanda voltará a crescer e isso pode ser um alento para o Estado em um momento próximo, especialmente se a taxa de câmbio permanecer elevada.
No Governo Casagrande, o Bandes tem se modernizado e, com isso, ampliando sua carteira de produtos e serviços para o empresariado. Como você pensa em se aproximar ainda mais dos segmentos produtivos?
Como mencionado, as medidas de distanciamento social interromperam uma série de atividades produtivas, no entanto, com a possível flexibilização, após a passagem pelo pico da pandemia, e as políticas de preservação do emprego, renda e produção, criadas e administradas pelos bancos públicos capixabas, será possível uma paulatina recuperação econômica e uma aproximação com os segmentos produtivos.
Informações sobre linhas de financiamento:
www.bandes.com.br
[email protected]