OPINIÃO: aspectos jurídicos do caso do latrocínio do motorista de aplicativo Amarildo
*Patrícia Peruzzo Nicolini – Sócia fundadora do escritório Morghetti e Peruzzo Advogados
Conforme noticiado pelo Espírito Santo Notícias, no dia 28 de setembro do corrente ano, o juiz titular da 2ª Vara Criminal da Comarca de Guarapari, condenou os responsáveis pela morte do motorista de aplicativo Amarildo Amaro Freire.
Segundo consta dos autos do processo, o caso ocorreu no dia 23 de março do corrente ano, quando os réus, Joadson Lima dos Santos, vulgo, “Gordinho” e Elias Brito Bernardes da Silva, vulgo “Curiri ou Bira”, com o auxílio do menor C.H.T.D.S, solicitaram um corrida pelo aplicativo de transporte e, de posse de uma espingarda e uma faca, subtraíram o veículo e um aparelho celular da vítima.
Ante a tentativa de fuga da vítima, os réus o prenderam no porta-malas do veículo com as mãos amarradas e ao chegarem a local ermo, ordenaram que a vítima saísse do veículo, após o que, com receio de ser executado, reagiu e fora atingido no rosto com um disparo de arma de fogo efetuado por Joadson e por golpes de facas desferidos por Elias e pelo menor, além de tentativa de asfixia com o uso do cinto de segurança do veículo, chutes e pauladas, tendo as ações dos criminosos provocado a morte da vítima.
Nos termos da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal de Guarapari/ES, os réus Joadson e Elias foram condenados a uma pena de 24 anos e seis meses de reclusão, inicialmente em regime fechado, pela prática dos crimes de latrocínio (roubo seguido de morte), corrupção de menores e ocultação de cadáver.
O crime de latrocínio encontra-se tipificado no artigo 157, §3°, II do Código Penal. Trata-se de uma forma qualificada do crime de roubo, cuja pena é aumentada porque a violência empregada resulta na morte da vítima.
Nos termos da Lei 8.072/90 o latrocínio é considerado crime hediondo, sendo, portanto, inafiançável, porque dele evidencia-se uma torpeza própria, tendo em vista que sua motivação decorre de questões financeiras.
O crime de latrocínio diferencia-se do crime de homicídio em razão do dolo daquele que executa o crime, ou seja, da intenção do criminoso. Enquanto no homicídio o dolo (intenção) do criminoso é produzir o resultado morte, ou seja, retirar a vida da vítima, no latrocínio o dolo (intenção) do criminoso é subtrair (tomar) o objeto da vítima mediante o uso de violência ou grave ameaça, mas a morte acaba sendo provocada.
Diante disto, considerando as circunstâncias em que o crime ocorreu, bem como diante do fato de que antes da sua execução, os réus haviam praticado três crimes de roubo nos dias 16, 17 e 22 de março, com igual modo de execução, no entanto, sem terem provocado a morte das respectivas vítimas, em relação aos crimes praticados contra Amarildo restou materializado o crime de latrocínio e não de homicídio.
Além da condenação pelo crime de latrocínio, os réus foram condenados pelo crime de ocultação de cadáver, previsto no artigo 211 do Código Penal por terem ocultado o corpo da vítima e também pelo crime de corrupção de menores previsto no artigo 244-B da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) tendo em vista terem executado os crimes com o auxílio do menor C.H.T.D.S.
No que se refere ao menor C.H.T.D.S este não responde pelos crimes juntamente com os outros dois criminosos uma vez que os menores de 18 anos são considerados inimputáveis, ou seja, não podem responder criminalmente por seus atos.
No entanto, o menor responde pela prática de ato infracional análogo ao crime de latrocínio e ocultação de cadáver, não estando sujeitos às penas previstas no Código Penal aplicadas aos demais executores do crime, e sim às medidas socioeducativas previstas na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Além da condenação decorrente dos crimes praticados contra a vítima Amarildo, os criminosos foram condenados em outros três processos há 10 anos, 2 meses e 14 dias de reclusão, em regime inicialmente fechado, pelos crimes de roubo qualificado praticados contra outros três motoristas de aplicativos nos dias 16, 17 e 22 de março, todos no Município de Guarapari, utilizando-se do mesmo “modus operandi”, ou seja, mesmo modo de execução, além do crime corrupção de menores tendo em vista a participação do menor também na execução destes crimes.
Por fim, cumpre esclarecer que da sentença que os condenou as penas dos crimes acima descritos, ainda cabe recurso ao Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo.
*Patrícia Peruzzo Nicolini – Advogada – OAB/ES 16.461, Pós Graduada em Direito Público – Sócia fundadora do escritório Morghetti e Peruzzo Advogados – Conselheira da Comissão da Mulher Advogada da 4ª Subseção da OAB/ES – Ex Procuradora Geral do Município de Muqui. E-mail: [email protected]