Surto de esporotricose preocupa populações do sul do estado: Anchieta e Piúma entre os desafios e soluções para controle da doença
A esporotricose, uma zoonose causada pelo fungo Sporothrix spp, tem se tornado uma preocupação crescente em municípios do litoral sul do Espírito Santo, como Anchieta e Piúma. O surto da doença, recorrente na mesma época do ano, exige ações coordenadas das autoridades de saúde, dos profissionais veterinários e da sociedade como um todo, para evitar uma escalada ainda maior dos casos entre animais e humanos.
A Natureza da doença
Conhecida como “doença do jardineiro” devido à sua relação com vegetação e matéria orgânica, a esporotricose hoje encontra nos gatos o principal vetor de transmissão. Segundo a médica veterinária Dra. Lauranne Salvato, especialista em ciências animais, o fungo pode ser transmitido através de arranhões, mordidas ou mesmo da saliva de gatos infectados. “O hábito dos felinos de cobrir suas necessidades com terra e afiar as unhas em árvores facilita a disseminação do fungo no ambiente”, explica.
Além disso, Lauranne destaca que o diagnóstico da doença pode ser complexo. Embora o padrão ouro seja a cultura do fungo, métodos como biópsia e citologia são usados para acelerar o início do tratamento, que costuma ser longo e agressivo, frequentemente envolvendo o medicamento itraconazol.
A Situação em Anchieta
Beatriz, guarda municipal e simpatizante da causa animal em Anchieta, relata que a esporotricose está disseminada por todo o município. Ela critica a falta de políticas eficazes para o manejo de animais de rua infectados. “O veterinário responsável afirma não ter condições de recolher os gatos contaminados, deixando-os sofrendo nas ruas, definhando aos poucos e contaminando pessoas e outros animais”, afirma.
Ela ainda destaca que a situação poderia ser diferente com planejamento e vontade política: “Na cidade de Vitória, foi implantado um programa que inclui recolhimento, exames, vacinação, microchipagem, esterilização e tratamento para esses animais, ajudando a reduzir a transmissão da doença.”
A ausência de um espaço adequado para o isolamento e tratamento dos animais agrava o problema. Segundo Beatriz, enquanto os gatos com tutores recebem tratamento, quando o CCZ fornece, os animais de rua permanecem sem assistência, o que representa uma contradição, já que eles são os principais agentes dispersores da doença.
A Vigilância em Saúde de Anchieta foi questionada sobre a situação da doença no município. Camila, gerente de Vigilância em Saúde, confirmou a existência de casos de esporotricose na cidade e informou que há um protocolo municipal para tratar tanto humanos quanto animais com tutor. Contudo, os dados mais detalhados são gerenciados pela equipe de zoonoses, coordenada pelo veterinário responsável, que também administra o programa local de tratamento. Assim que mais informações forem obtidas, a matéria será atualizada.
Ações em Piúma
O secretário de Saúde de Piúma, Caio César de Souza Barbosa, detalhou que o município registrou, em 2024, 40 casos confirmados em animais e dois em humanos. Apesar de não contar com um Centro de Zoonoses, Piúma disponibiliza gratuitamente o itraconazol para humanos e animais infectados. A vigilância ambiental também tem realizado ações de monitoramento e controle.
Caio destaca a importância do diagnóstico precoce: “Quanto antes a doença for identificada e tratada, mais rápido e seguro será o processo de cura, tanto para os animais quanto para as pessoas.”
Prevenção e conscientização: o caminho a seguir
Para Lauranne, a chave para o controle da esporotricose está na educação da população. “A desinformação é o maior aliado da doença. É essencial manter os gatos castrados e dentro de casa, além de adotar medidas de higiene no manuseio de animais e materiais orgânicos”, recomenda.
A castração é um ponto crítico, já que gatos não castrados tendem a vagar e brigar, aumentando os riscos de transmissão. Outra recomendação é o uso de equipamentos de proteção, como luvas, ao manusear animais suspeitos ou ambientes potencialmente contaminados.
Perspectivas e necessidades
A comparação com Vitória, que implementa políticas de recolhimento de animais infectados, gera questionamentos sobre a falta de iniciativas semelhantes em cidades do sul, como Iconha, Anchieta e Piúma. A ausência de espaços para tratamento e isolamento dos animais de rua evidencia um absimo entre as políticas públicas locais.
Enquanto isso, especialistas, como Lauranne, reforçam que a esporotricose pode ser controlada com esforço conjunto, mas é necessário investimento em infraestrutura, campanhas educativas e maior comprometimento político.
O surto anual da doença no estado não é apenas uma questão de saúde pública, mas também um desafio ético. Animais infectados, muitas vezes abandonados à própria sorte, enfrentam sofrimento extremo enquanto espalham a doença. A resposta para esse problema exige empatia, ciência e ações coordenadas.
Afinal, é possível reverter esse cenário com políticas mais inclusivas e eficazes, garantindo saúde para todos os envolvidos.